Samyutta Nikaya IV.25

Maradhitu Sutta

As Filhas de Mara

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Então, Mara, o Senhor do Mal, tendo dito aqueles versos de desapontamento na presença do Abençoado, saiu daquele lugar e sentou no chão com as pernas cruzadas, não muito distante do Abençoado, silencioso, desanimado, com os ombros caídos, abatido, chocado, incapaz de dizer uma palavra, raspando o chão com uma vara. [1]

Então, as filhas de Mara - Tanha, Arati e Raga - foram até Mara, o Senhor do Mal, e se dirigiram a ele em versos: [2]

“Porque você está deprimido, pai?
Quem é o homem pelo qual você sofre?
Nós o agarraremos com a armadilha da cobiça
tal como se agarra um elefante da floresta.
Nós o ataremos com firmeza e o traremos de volta,
e ele estará sob o seu controle.” [3]

[Mara:]

“O Arahant, o Abençoado no mundo,
não é atraído facilmente através da cobiça.
Ele foi além do reino de Mara:
por isso sofro tão amargamente.”

Então, as filhas de Mara - Tanha, Arati e Raga - foram até o Abençoado e disseram: “Nós o servimos aos seus pés, contemplativo.” Mas o Abençoado não lhes deu atenção, visto que ele estava libertado na insuperável extinção das aquisições.[4]

Então, as filhas de Mara - Tanha, Arati e Raga – foram para um lado para se aconselharem: “Os gostos dos homens são variados. E se cada uma de nós nos manifestássemos sob a forma de cem virgens.” Então as filhas de Mara, cada uma se manifestando sob a forma de cem virgens, foram até o Abençoado e disseram: “Nós o servimos aos seus pés, contemplativo.” Mas o Abençoado não lhes deu atenção, visto que ele estava libertado na insuperável extinção das aquisições.

Então, as filhas de Mara foram para um lado para novamente se aconselharem: “Os gostos dos homens são variados. E se cada uma de nós nos manifestássemos sob a forma de cem mulheres que nunca deram à luz.” Então as filhas de Mara, cada uma se manifestando sob a forma de cem mulheres que nunca deram à luz ... sob a forma de cem mulheres que deram à luz uma vez ... sob a forma de cem mulheres que deram à luz duas vezes ... sob a forma de cem mulheres maduras .... sob a forma de cem mulheres velhas, foram até o Abençoado e disseram: “Nós o servimos aos seus pés, contemplativo.” Mas o Abençoado não lhes deu atenção, visto que ele estava libertado na insuperável extinção das aquisições.

Então, as filhas de Mara - Tanha, Arati e Raga – foram para um lado e disseram: “Aquilo que o nosso pai nos disse é verdade:

“’O Arahant, o Abençoado no mundo,...
por isso sofro tão amargamente.’

“Se, com tais táticas, tivéssemos assaltado qualquer contemplativo ou brâmane que não estivesse desprovido de cobiça, ou o coração dele teria explodido, ou ele teria vomitado sangue quente pela boca, ou teria ficado maluco ou mentalmente perturbado; ou então, ele teria secado e murchado e teria ficado todo enrugado, tal qual um capim verde que, quando cortado, seca e murcha e fica todo enrugado.”

Então, as filhas de Mara - Tanha, Arati e Raga - foram até o Abençoado e ficaram em pé a um lado e se dirigiram ao Abençoado em versos:

“É por estar afundado na tristeza
que você medita na floresta?
Porque você perdeu riqueza ou por ela anseia,
ou cometeu algum crime no vilarejo?
Porque você não faz amizade com as pessoas?
Porque você não cria laços íntimos?”

[O Abençoado:]

“Tendo conquistado a legião do prazeroso e do agradável,
meditando só, eu descobri a bem-aventurança,
a realização do objetivo, a paz no coração.
Portanto, eu não faço amizades com as pessoas,
nem crio laços íntimos.”

Então, a filha de Mara, Arati, se dirigiu ao Abençoado em versos:

“Como é que aqui um bhikkhu permanece frequentemente,
de modo que, cruzadas as cinco torrentes, ele tenha aqui cruzado a sexta?
Como ele medita de modo que as percepções sensuais
sejam mantidas à distância e deixem de aprisioná-lo?[5]

[O Abençoado:]

“Com o corpo tranqüilo e com a mente bem libertada,
não gerando, com atenção plena, na vida santa,
conhecendo o Dhamma, meditando livre de pensamentos,
ele não irrompe ou deriva, ou enrijece. [6]

“Quando aqui um bhikkhu assim permanece frequentemente,
tendo cruzado as cinco torrentes, ele aqui cruza a sexta.
Quando ele assim medita, as percepções sensuais
são mantidas à distância e deixam de aprisioná-lo.”

Então, a filha de Mara, Raga, se dirigiu ao Abençoado em versos:

“Ele decepou o desejo, com o seu grupo e ordem;
com certeza muitos outros seres irão cruzar.
Ai de mim, esse contemplativo irá arrebatar muitas pessoas
e conduzí-las para além do Rei da Morte.”

[O Abençoado:]

“Deveras os Tathagatas, os grandes heróis,
lideram por meio do verdadeiro Dhamma.
Quando eles lideram por meio do Dhamma,
que inveja pode haver naqueles que compreendem?”

Então, as filhas de Mara - Tanha, Arati e Raga - foram até Mara, o Senhor do Mal. Mara as viu vindo à distância e se dirigiu a elas em versos:

“Tolas! Vocês tentaram bater numa montanha
com talos de flores de lótus,
cavar uma montanha com as suas unhas,
mastigar ferro com os seus dentes.

“Como se, tendo levantado uma pedra com a cabeça,
vocês buscassem por um apoio no abismo;
como se golpeassem um toco com o peito,
vocês, desapontadas, deixaram Gotama.”

Elas vieram até ele com a beleza deslumbrante - Tanha, Arati e Raga - mas o Mestre as varreu ali mesmo, tal qual o vento varre um tufo de algodão caído.

 


 

Notas:

[1] Os versos de desapontamento se referem ao encontro de Mara com o Buda no sutta anterior. [Retorna]

[2] Os seus nomes significam Desejo, Descontentamento e Cobiça. Elas viram o pai deprimido e se aproximaram para descobrir qual a razão. [Retorna]

[3] A explicação do comentário: “Um elefante é capturado e conduzido para fora da floresta usando uma fêmea como isca.” [Retorna]

[4] O significado é “queremos estar sob o seu controle como escravas.” É óbvio que essa é uma insinuação de caráter sexual. [Retorna]

[5] Cinco torrentes: atravessou as torrentes das impurezas nas cinco portas dos sentidos. A sexta: a mente. Ou como alternativa, as cinco torrentes são os cinco primeiros grilhões e a sexta os outros cinco grilhões. [Retorna]

[6] Corpo tranqüilo: a tranqüilização da respiração no quarto jhana. Mente bem libertada: com o fruto do estado de arahant. Não gerando: não gerando os três tipos de formações volitivas (veja o SN XII.51). Meditando livre de pensamentos: no quarto jhana. Ele não irrompe ou deriva, ou enrijece: não irrompe devido à raiva, não deriva devido à cobiça e não enrijece devido à delusão. [Retorna]

 

 

Revisado: 5 Fevereiro 2005

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