Digha Nikaya 17

Mahasudassana Sutta

O Grande Esplendor (A Renúncia de um Rei)

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1.1. Assim ouvi. [1] Em certa ocasião, o Abençoado estava em Kusinara, no bosque de árvores sal dos Mallas pouco antes do parinibbana.

1.2. Então, o venerável Ananda foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou a um lado e disse: “Venerável senhor, que o Abençoado não morra nesta pequena cidade miserável feita com paus-a-pique, cercada pela floresta no meio de nada! Venerável senhor, há outras grandes cidades tais como Campa, Rajagaha, Savatthi, Saketa, Kosambi ou Benares. Nesses lugares há Khattiyas, Brâmanes e chefes de família prósperos que são devotos do Tathagata e proverão um funeral adequado para o Tathagata.”

1.3. “Ananda, não diga que aqui é uma pequena cidade miserável feita com paus-a-pique, cercada pela floresta no meio de nada! Certa vez, Ananda houve um rei chamado Mahasudassana que girou a roda, um monarca justo de acordo com o Dhamma, conquistador dos quatro pontos cardeais, inconquistável, que havia estabelecido a segurança no seu reino. E esse Rei Mahasudassana tinha nesta mesma Kusinara, sob o nome Kusavati, a sua capital. E essa cidade tinha doze yojanas de extensão de leste a oeste, e sete yojanas de extensão de norte a sul. Kusavati era rica, próspera e populosa, repleta de gente e bem suprida. Tal como a cidade dos devas Alakamanda é rica, próspera e populosa, repleta de yakkhas e bem suprida, da mesma forma a capital real Kusavati. E Kusavati nunca se via livre de dez tipos de sons durante o dia ou noite: o som de elefantes, cavalos, carruagens, tambores, caixas, alaúdes, canto, címbalos, gongos e exclamações ‘coma, beba e se divirta’ como décimo.

1.4. “A capital real Kusavati estava cercada com sete muralhas. Uma de ouro, outra de prata, outra de berilos, outra de cristais, outra de rubis, outra de esmeraldas e outra com todo tipo de pedras preciosas.

1.5. “Os portões de Kusavati tinham quatro cores: dourada, prateada, a cor do berilo e do cristal. E antes de cada portão haviam sete pilares com três ou quatro alturas de um homem. Um era de ouro, o outro de prata, outro de berilos, outro de cristais, outro de rubis, outro de esmeraldas e outro com todo tipo de pedras preciosas.

1.6. “Kusavati era cercada por sete fileiras de palmeiras, dos mesmos materiais. As árvores de ouro tinham o tronco de ouro e as folhas e frutos de prata, as árvores de prata tinham o tronco de prata e as folhas e frutos de ouro. As árvores de berilo tinham o tronco de berilos e as folhas e frutos de cristais, as árvores de cristais tinham o tronco de cristais e as folhas e frutos de berilos. As árvores de rubis tinham o tronco de rubis e as folhas e frutos de esmeraldas, as árvores de esmeraldas tinham os troncos de esmeraldas e as folhas e frutos de rubis, enquanto que as árvores com todo o tipo de pedras preciosas tinham essas pedras no tronco, folhas e frutos. O som das folhas tocadas pelo vento era agradável, delicioso, doce e embriagante, tal como o som dos cinco tipos de instrumentos musicais tocados num concerto por músicos hábeis e bem treinados. [2] E, Ananda, os licenciosos e beberrões em Kusavati tinham os seus desejos apaziguados pelo som das folhas tocadas pelo vento.

1.7. “O Rei Mahasudassana possuía os sete tesouros e os quatro tipos de poder. Quais eram os sete tesouros? Certa vez o Rei lavou a cabeça no Uposatha do décimo quinto dia [3] e foi até o terraço no topo do palácio para o Uposatha, a Roda Preciosa [4] surgiu para ele, com mil raios, com a roda, o cubo, completa em todos os aspectos. Ao vê-la, o Rei Mahasudassana pensou: ‘Eu ouvi que quando um Rei Khattiya ungido tiver lavado a cabeça no Uposatha do décimo quinto dia e tiver ido até o terraço no topo do palácio para o Uposatha e ali aparecer a roda preciosa com mil raios, com a roda, o cubo, completa em todos os aspectos, então ele se tornará um Monarca que gira a roda. Eu sou então um Monarca que gira a roda?’

1.8. “Então, levantando-se do seu assento e arrumando o manto externo sobre o ombro, o Rei tomou um vaso com água com a mão esquerda, borrifou a Roda com a mão direita e disse: ‘Gire para adiante, boa roda preciosa; triunfe, boa roda preciosa!’ Então, a roda girou para adiante na direção leste e o Rei a seguiu com o seu exército. Agora, em qualquer região na qual a Roda parasse, ali o Rei estabelecia residência com o seu exército.

1.9. “E aqueles que antes a ele se opunham na região leste vinham e diziam: ‘Venha, grande Rei; bem vindo, grande Rei; comande, grande Rei; aconselhe, grande Rei.’ O Rei assim dizia: ‘Vocês não devem matar seres vivos; vocês não devem tomar aquilo que não for dado; vocês não devem agir de forma imprópria em relação aos prazeres sensuais; vocês não devem dizer mentiras; vocês não devem beber bebidas embriagantes; sejam moderados na alimentação.’[5] E aqueles que antes a ele se opunham na região leste se tornaram seus súditos.

1.10. “Então, a roda mergulhou no oceano do leste e emergiu outra vez. E nisso, ela girou para adiante, na direção sul ... E aqueles que se opunham na região sul se submeteram ao Rei. Então, a roda mergulhou no oceano do sul e emergiu outra vez. E nisso, ela girou para adiante, na direção oeste ... E aqueles que se opunham na região oeste se submeteram ao Rei. Então, a roda mergulhou no oceano do oeste e emergiu outra vez. E nisso, ela girou para adiante, na direção norte ... E aqueles que se opunham na região norte se submeteram ao Rei.

1.11. “Agora, quando a roda preciosa triunfou sobre a terra de oceano a oceano, ela retornou para a capital real e permaneceu como que presa pelo eixo ao portão do principal palácio do Rei Mahasudassana, como um adorno no portão do palácio principal. Assim foi como a roda preciosa apareceu para o Rei Mahasudassana.

1.12. “Então, o elefante precioso apareceu para o Rei Mahasudassana, todo branco, com postura sétupla, com poderes supra-humanos, voando através do espaço, o rei dos elefantes chamado ‘Uposatha.’ Ao vê-lo, a mente do Rei teve confiança nele assim: ‘Seria maravilhoso montar no elefante, se ele se submetesse ao treinamento!’ Então, o elefante precioso se submeteu ao treinamento como um fino elefante puro-sangue bem domesticado há muito tempo. E assim sucedeu que o Rei, ao testar o elefante precioso, montava nele pela manhã e depois de atravessar toda a terra até a margem do oceano, retornava à capital real para a refeição matinal. Assim foi como o elefante precioso apareceu para o Rei Mahasudassana.

1.13. “Então, o cavalo precioso apareceu para o Rei Mahasudassana, todo branco, com a cabeça negra e lustrosa e a crina como a erva munja, com poderes supra-humanos, voando através do espaço, o rei dos cavalos chamado ‘Valahaka’, [‘Nuvem de Tormenta’]. Ao vê-lo, a mente do Rei teve confiança nele assim: ‘Seria maravilhoso montar no cavalo, se ele se submetesse ao treinamento!’ Então, o cavalo precioso se submeteu ao treinamento tal como um fino cavalo puro-sangue bem domesticado há muito tempo. E assim sucedeu que o Rei, ao testar o cavalo precioso, montava nele pela manhã e depois de atravessar toda a terra até a margem do oceano, retornava à capital real para a refeição matinal. Assim foi como o cavalo real apareceu para o Rei Mahasudassana.

1.14. “Então, a jóia preciosa apareceu para o Rei Mahasudassana. A jóia era um fino berilo da mais pura água, com oito facetas, bem lapidada. Agora, a luminosidade da jóia preciosa se espalhava ao redor por uma légua. E assim aconteceu que quando o Rei estava testando a jóia preciosa, ele colocou em formação o seu exército e instalando a jóia no topo do seu estandarte, ele saiu nas trevas e escuridão da noite. Então, todos os [habitantes dos] vilarejos próximos começaram o seu trabalho devido à luz, pensando que fosse dia. Assim foi como a jóia preciosa apareceu para o Rei Mahasudassana.

1.15. “Então, a mulher preciosa apareceu para o Rei Mahasudassana, bela, atraente e graciosa, possuindo a complexão da suprema beleza, nem muito alta nem muito baixa, nem muito magra nem muito robusta, nem muito escura nem muito clara, superando a beleza humana, sem alcançar a beleza divina. O toque da mulher preciosa era tal que se igualava a um tufo de paina ou um tufo de algodão. Quando estava frio os membros dela estavam quentes; quando estava quente os membros dela estavam frios. Do seu corpo emanava o perfume do sândalo e da sua boca o perfume do lótus. Ela se levantava antes do Rei e se deitava depois dele. Ela era ávida por servir, com conduta agradável e com a linguagem doce. Como ela nunca foi infiel ao Rei, sequer em pensamento, como poderia ela sê-lo com o corpo? Assim foi como a mulher preciosa apareceu para o Rei Mahasudassana.

1.16. “Então, o tesoureiro precioso apareceu para o Rei Mahasudassana. O olho divino nascido do kamma passado se manifestou nele e através deste ele via depósitos ocultos de tesouros, com e sem proprietários. Ele se aproximava do Rei e dizia: ‘Senhor, fique tranqüilo. Eu tomarei conta dos seus assuntos financeiros.’ E assim aconteceu quando o Rei estava testando o tesoureiro precioso, ele embarcou num navio e saindo pelo rio Gânges, no meio da correnteza ele disse para o tesoureiro precioso: ‘Eu preciso de ouro e lingotes, tesoureiro.’ – ‘Então, senhor, deixe que o barco seja dirigido para uma das margens.’ – ‘Tesoureiro, na verdade é aqui que preciso de ouro e lingotes.’ Então, otesoureiro precioso mergulhou ambas as mãos na água e ergueu um pote cheio de ouro e lingotes e disse para o Rei: ‘Isso é o suficiente, senhor? O oferecido é suficiente, o ofertado é suficiente?’ – ‘Isso é suficiente, tesoureiro, o suficiente foi feito, o suficiente foi ofertado.’ Assim foi como o tesoureiro precioso apareceu para o Rei Mahasudassana.

1.17. “Então, o conselheiro precioso apareceu para o Rei Mahasudassana, sábio, esperto e sagaz, capaz de fazer com que o Rei promovesse aquilo que fosse digno de ser promovido, de descartar aquilo que devesse ser descartado e de estabelecer aquilo que devesse ser estabelecido. Ele se aproximava do Rei e dizia: ‘Senhor, fique tranqüilo. Eu o aconselharei.’ Assim foi como o conselheiro precioso apareceu para o Rei Mahasudassana. Esses eram os sete tesouros que o Rei Mahasudassana possuía.

1.18. “Novamente, Ananda, o Rei possuía quatro poderes. [6] Quais eram eles? Primeiro, o Rei era belo, atraente e elegante, possuindo a complexão da beleza suprema, e ele superava todos os outros homens nesse aspecto.

1.19. “Segundo, o Rei vivia por muito tempo superando todos os outros homens nesse aspecto.

1.20. “Terceiro, ele estava livre das enfermidades e aflições, possuindo boa digestão que não era nem muito fria, nem muito quente, superando todos os outros homens nesse aspecto.

1.21. “Quarto, ele era querido e estimado pelos brâmanes e chefes de família. Como um pai é querido e estimado pelos seus filhos, assim também o Rei era querido e estimado pelos brâmanes e chefes de família. Brâmanes e chefes de família também eram queridos e estimados pelo Rei. Como os filhos são queridos e estimados pelo pai, assim também brâmanes e chefes de família eram queridos e estimados pelo Rei. Certa vez o Rei estava num parque das delícias com o seu exército completo. Então, os brâmanes e chefes de família foram até ele e disseram o seguinte: ‘Senhor, conduza devagar para que possamos vê-lo por mais tempo.’ E assim ele disse para o seu cocheiro: ‘Cocheiro, conduza mais devagar para que eu possa ver os brâmanes e chefes de família por mais tempo.’ Esses são os quatro tipos de poder que o Rei Mahasudassana possuía.

1.22. “Então, o Rei Mahasudassana pensou: ‘E se eu construísse piscinas com flores de lótus entre as palmeiras?’ E assim ele fez. As piscinas foram revestidas com azulejos de quatro cores, ouro, prata, berilo e cristal, cada piscina tendo quatro escadas, uma de ouro, outra de prata, outra de berilo e outra de cristal. E a escada de ouro tinha quatro pilares de ouro com corrimão e balaústres de prata, a escada de prata tinha quatro pilares de prata e corrimão e balaústres de ouro, e assim por diante. E as piscinas com flores de lótus tinham dois tipos de grade, ouro e prata – as grades de ouro tinham pilares de ouro, corrimão e balaústres de prata e as grades de prata tinham pilares de prata, corrimão e balaústres de ouro.

1.23. “Então, o Rei pensou: ‘E se eu abastecesse cada piscina com as flores adequadas para fazer grinaldas – flores de lótus azuis, amarelas, vermelhas e brancas que durassem por todas as estações sem desbotar?’ E assim ele fez. Então ele pensou: ‘E se eu colocasse banhistas na beira das piscinas para banhar aqueles que lá fossem?’ E assim ele fez. Então, ele pensou: ‘E se eu instalasse postos de caridade próximos às piscinas de modo que aqueles que necessitam comida possam comer, aqueles que necessitam bebida possam beber, aqueles que necessitam roupas possam se vestir, aqueles que necessitam transporte possam ser transportados, aqueles que necessitam descanso possam descansar, aqueles que necessitam uma esposa possam se casar e aqueles que necessitam de moedas de ouro possam obtê-las?’ E assim ele fez.

1.24. “Então, os Brâmanes e chefes de família obtiveram muita riqueza e foram até o Rei e disseram: ‘Senhor, aqui está a riqueza que juntamos especialmente para o Rei, por favor aceite-a!’ ‘Obrigado, amigos, mas eu tenho riqueza suficiente proveniente das rendas de acordo com as leis. Fiquem com essa riqueza e além disso, aceitem um pouco mais!’ Tendo sido dessa forma recusados pelo Rei, eles se reuniram num canto e consideraram: ‘Não seria correto que levássemos essa riqueza de volta para casa. E se nós construíssemos uma moradia para o Rei Mahasudassana.’ Então, eles foram até o Rei e disseram: ‘Senhor, nós construiremos uma moradia para você,’ e o Rei concordou em silêncio.

1.25. “Entã, Sakka, o senhor dos devas, compreendendo com a sua mente o pensamento na mente do Rei Mahasudassana, disse para o criado deva Vissakamma: ‘Venha, amigo Vissakamma, construa uma moradia para o Rei Mahasudassana, um palácio chamado Dhamma.’ ‘Muito bem, Senhor, Vissakamma respondeu, e com a mesma rapidez com que um homem forte pode estender o seu braço flexionado ou flexionar o seu braço estendido ele desapareceu do paraíso do Trinta e Três e apareceu na frente do Rei Mahasudassana, dizendo: ‘Senhor, eu construirei uma moradia para você, um palácio chamado Dhamma.’ O Rei concordou em silêncio e Vissakamma construiu o Palácio do Dhamma.

1.26. “O Palácio do Dhamma, Ananda, tinha uma légua de extensão de leste a oeste e meia légua de extensão de norte a sul. Todo o palácio até o equivalente à altura de três homens estava recoberto com azulejos de quatro cores: ouro, prata, berilo e cristal e ele continha oitenta e quatro mil colunas das mesmas cores. O palácio tinha vinte quatro escadarias com as mesmas quatro cores e as escadarias de ouro tinham pilares de ouro com corrimão e balaústres de prata ... (igual ao verso 23). O palácio também tinha oitenta e quatro mil cômodos com as mesmas cores. No cômodo de ouro havia um sofá de prata, no cômodo de prata havia um sofá de ouro, no cômodo de berilo havia um sofá de marfim e no cômodo de cristal um sofá de sândalo. Na porta do cômodo de ouro havia a representação de uma palmeira de prata, com o tronco de prata, folhas e frutos de ouro ... Na porta do cômodo de prata havia a representação de uma palmeira de ouro, com o tronco de ouro, folhas e frutos de prata, na porta do cômodo de berilo havia a representação de uma palmeira de cristal, com o tronco de cristal, folhas e frutos de berilo, na porta do cômodo de cristal havia a representação de uma palmeira de berilo, com tronco de berilo, folhas e frutos de cristal.

1.27. “Então, o Rei pensou: ‘E seu eu fizesse um bosque de palmeiras todas de ouro em frente à porta do grande salão com cumeeira onde passo os dias?’ E assim ele fez.

1.28. “Em volta do Palácio do Dhamma havia duas grades, uma de ouro, outra de prata. A de ouro tinha pilares de ouro, corrimão e balaústres de prata e a grade de prata tinha pilares de prata, corrimão e balaústres de ouro.

1.29. “O Palácio do Dhamma estava circundado por duas carreiras com sinos. Uma carreira era de ouro com sinos de prata, a outra de prata com sinos de ouro. E quando as carreiras eram tocadas pelo vento o som produzido era agradável, delicioso, doce e embriagante, tal como o som dos cinco tipos de instrumentos musicais tocados num concerto por músicos hábeis e bem treinados. E os licenciosos e beberrões em Kusavati tinham os seus desejos apaziguados pelo som dos sinos tocados pelo vento.

1.30. “Quando o Palácio do Dhamma foi concluído, era difícil de olhar para ele, ofuscava os olhos, como no último mês da estação das chuvas, no outono, quando o céu está claro e sem nuvens, é difícil manter os olhos no sol rompendo a névoa, assim também era o Palácio do Dhamma depois de concluído.

1.31. “Então, o Rei pensou: ‘E se eu construísse uma piscina com flores de lótus chamada Dhamma em frente ao Palácio do Dhamma?’ E assim ele fez. A piscina tinha uma légua de extensão de leste a oeste e meia légua de extensão de norte a sul, e foi revestida com azulejos de quatro cores, ouro, prata, berilo e cristal, com quatro escadas, uma de ouro, outra de prata, outra de berilo e outra de cristal. E a escada de ouro tinha quatro pilares de ouro ... (igual ao verso 22).

1.32. “A piscina do Dhamma estava circundada por sete tipos de palmeiras. O som produzido pelas folhas tocadas pelo vento era agradável, delicioso, doce e embriagante, tal como o som dos cinco tipos de instrumentos musicais tocados num concerto por músicos hábeis e bem treinados. E, Ananda, os licenciosos e beberrões em Kusavati tinham os seus desejos apaziguados pelo som dos sinos tocados pelo vento.

1.33. “Quando o Palácio do Dhamma e a Piscina do Dhamma haviam sido concluídos, o Rei Mahasudassana, tendo satisfeito todos os desejos daqueles que na época eram contemplativos ou Brâmanes, ou venerados como tais, foi para o Palácio do Dhamma.”

[Fim da primeira recitação]

2.1. “Então, o Rei Mahasudassana pensou: ‘De qual kamma é o fruto, de qual kamma é o resultado, o fato de eu agora ser tão forte e poderoso?’ Então, ele pensou: ‘Esse é o fruto de três tipos de kamma: da generosidade, do autocontrole e da contenção” [7]

2.2. “Então, o Rei foi até o grande salão com cumeeira e parando na porta exclamou: ‘Que o pensamento de cobiça cesse! Que o pensamento de má vontade cesse! Que o pensamento de crueldade cesse! Que não ocorram mais pensamentos de cobiça, má vontade ou crueldade!’

2.3. “Então, o Rei entrou no grande salão com cumeeira e sentou com as pernas cruzadas num sofá de ouro e afastado dos prazeres sensuais, afastado das qualidades não hábeis, ele entrou e permaneceu no primeiro jhana, que é caracterizado pelo pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e felicidade nascidos do afastamento. Abandonando o pensamento aplicado e sustentado, ele entrou e permaneceu no segundo jhana, que é caracterizado pela segurança interna e perfeita unicidade da mente, sem o pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e felicidade nascidos da concentração. Abandonando o êxtase, ele entrou e permaneceu no terceiro jhana que é caracterizado pela felicidade sem o êxtase, acompanhada pela atenção plena, plena consciência e equanimidade, acerca do qual os nobres declaram: ‘Ele permanece numa estada feliz, equânime e plenamente atento.’ Com o completo desaparecimento da felicidade, ele entrou e permaneceu no quarto jhana, que possui nem felicidade nem sofrimento, com a atenção plena e a equanimidade purificadas.

2.4. “Então, o Rei, saiu do grande salão com cumeeira e foi para o salão com cumeeira de ouro e sentou com as pernas cruzadas num sofá de prata e permaneceu permeando o primeiro quadrante com a mente imbuída de amor bondade, da mesma forma o segundo, da mesma forma o terceiro, da mesma forma o quarto; assim acima, abaixo, em volta e em todos os lugares, para todos bem como para si mesmo, ele permaneceu permeando o mundo todo com a mente imbuída de amor bondade, abundante, transcendente, imensurável, sem hostilidade e sem má vontade. E ele fez o mesmo com a mente imbuída de compaixão, alegria altruísta e equanimidade. [8]

2.5. “O Rei Mahasudassana tinha oitenta e quatro mil cidades e a capital Kusavati era a principal, ele tinha oitenta e quatro mil palácios e o Palácio do Dhamma era o principal; ele tinha oitenta e quatro mil salões com cumeeira e o grande salão com cumeeira era o principal; ele tinha oitenta e quatro mil sofás de ouro, prata, marfim, sândalo, cobertos com colchas felpudas, coberta com colchas de lã branca, colchas bordadas, peles de antílope e gamo, coberta com um baldaquino e com almofadas vermelhas para a cabeça e os pés; ele tinha oitenta e quatro mil elefantes adornados com ornamentos de ouro, com estandartes de ouro e cobertos com redes de ouro, Uposatha o elefante real era o principal; ele tinha oitenta e quatro mil carruagens cobertas com peles de leão, peles de tigre, peles de leopardos ou com tecidos alaranjados adornados com ornamentos de ouro, com estandartes de ouro e cobertas com redes de ouro, a carruagem Vejayanta era a principal; ele tinha oitenta e quatro mil jóias sendo que a jóia preciosa era a principal; ele tinha oitenta e quatro mil esposas sendo que a Rainha Subhadda era a principal; ele tinha oitenta e quatro mil chefes de família sendo que o chefe de família precioso era o principal; ele tinha oitenta e quatro mil empregados Khattiya sendo que o conselheiro precioso era o principal; ele tinha oitenta e quatro mil vacas com ubres como fina juta e baldes de prata; ele tinha oitenta e quatro mil fardos de roupas feitas do mais fino linho, algodão, seda e lã; ele tinha oitenta e quatro mil oferendas de arroz que ali estavam para alimentar os necessitados, noite e dia.

2.6. “Naquela época, os oitenta e quatro mil elefantes do Rei Mahasudassana o serviam noite e dia. E ele pensou: ‘Esses oitenta e quatro mil elefantes me servem noite e dia. E se ao final de cada século quarenta e dois mil elefantes me servissem e fizessem um rodízio?’ E ele deu instruções nesse sentido para o conselheiro precioso e assim foi feito.

2.7. “E, Ananda, depois de muitas centenas, centenas de milhares de anos, a Rainha Subhadda pensou: ‘Já faz muito tempo que não vejo o Rei Mahasudassana. E se eu fosse vê-lo?’ Assim ela disse para as suas aias: ‘Venham agora, lavem as cabeças e vistam roupas limpas. Já faz muito tempo que não vimos o Rei Mahasudassana. Devemos ir vê-lo.’ ‘Sim, Majestade’, elas responderam e se arrumaram e depois foram ter com a Rainha. A Rainha Subhadda disse para o conselheiro precioso: ‘Amigo conselheiro, reúna o exército com quatro divisões. Já faz muito tempo que não vimos o Rei Mahasudassana. Devemos ir vê-lo.’ ‘Muito bem, Majestade’, o conselheiro precioso respondeu e tendo reunido o exército, ele comunicou à Rainha: ‘Agora é o momento Majestade, faça como julgar adequado.’

2.8. “Então, a Rainha Subhadda com o exército com quatro divisões e mais as suas aias foi até o Palácio do Dhamma e depois de entrar foi até o grande salão com cumeeira e parou encostada ao umbral da porta. E o Rei Mahasudassana, pensando: ‘Que barulho tão forte, como de uma multidão?’ saiu por uma porta e viu a Rainha Subhadda encostada ao umbral da porta. Ele disse: ‘Fique aí, Rainha! Não entre!’

2.9. “Então, o Rei Mahasudassana disse para um certo homem: ‘Aqui, rapaz, vá até o grande salão com cumeeira, traga para fora o sofá de ouro e coloque-o entre as palmeiras de ouro.’ ‘Muito bem, senhor’, o homem disse, e assim fez. Então, o Rei Mahasudassana se deitou no seu lado direito, na postura do leão com um pé sobre o outro, atento e plenamente consciente. [9]

2.10. “Então, a Rainha Subhadda pensou: ‘As faculdades do Rei Mahasudassana estão serenas, a sua complexão está límpida e brilhante, Oh! – espero que ele não esteja morto.’[10] Assim ela disse: ‘Senhor, das suas oitenta e quatro mil cidades, Kusavati é a principal. Faça um desejo, desperte o desejo em viver lá!’ Dessa forma, recordando-o de todas as suas posses reais (igual ao verso 2.5) ela o exortou a desejar continuar vivo.

2.11. “Em vista disso, o Rei Mahasudassana disse para a Rainha: ‘Durante muito tempo, Rainha, você disse palavras agradáveis, deliciosas, prazerosas para mim, mas agora neste momento as suas palavras são desagradáveis, ruins, desprazerosas.’ ‘Senhor, o que então devo falar?’

‘Assim é como você deve falar: “Todas as coisas prazerosas e sedutoras estão sujeitas à mudança, ao desaparecimento, tornando-se diferentes. Senhor, não morra cheio de desejos. Morrer cheio de desejos é doloroso e censurável. Das sua oitenta e quatro mil cidades, Kusavati é a principal: abandone o desejo, abandone a cobiça em viver lá ... Dos seus oitenta e quatro mil palácios, o Palácio do Dhamma é o principal: abandone o desejo, abandone a cobiça em viver lá ...” (e assim por diante, igual ao verso 2.5)

2.12. “Em vista disso, a Rainha Subhadda gritou e desatou a chorar. Depois, limpando as lágrimas, ela disse: ‘Senhor, todas as coisas prazerosas e sedutoras estão sujeitas à mudança ... Senhor, não morra cheio de desejos.’

2.13. “Pouco tempo depois, o Rei Mahasudassana morreu e da mesma forma que um chefe de família ou o seu filho podem se sentir letárgicos depois de uma deliciosa refeição, assim foi a sensação que ele sentiu ao falecer, e ele teve um renascimento favorável no mundo de Brahma.

“Durante oitenta e quatro mil anos o Rei Mahasudassana brincou com jogos infantis, durante oitenta e quatro mil anos ele atuou como vice-regente; durante oitenta e quatro mil anos ele governou o reino; durante oitenta e quatro mil anos, como um leigo ele viveu a vida santa no Palácio do Dhamma. E tendo praticado as quatro moradas puras, ao morrer, com a dissolução do corpo ele renasceu no mundo de Brahma.

2.14. “Agora, Ananda, você poderá pensar assim: ‘Com certeza, uma outra pessoa era o Rei Mahasudassana naquela ocasião.’ Mas essa não deve ser a interpretação. Era eu o Rei Mahasudassana naquela ocasião. Aquelas oitenta e quatro mil cidades, entre as quais Kusavati era a principal, eram minhas ... as oitenta e quatro mil oferendas de arroz ... eram minhas.

2.15. “E daquelas oitenta e quatro mil cidades eu habitava apenas uma, Kusavati, ... das oitenta e quatro mil esposas que eu tinha, apenas uma cuidava de mim, e elas se chamavam Khattiyani ou Velamikani;[11] dos oitenta e quatro mil fardos de roupas eu tinha apenas um ...; das oitenta e quatro mil oferendas de arroz havia apenas uma medida que eu comia.

2.16. “Você vê, Ananda, como todos esses estados condicionados do passado mudaram e desapareceram! Portanto, Ananda, os estados condicionados são impermanentes, eles são instáveis, eles não nos confortam, e em sendo esse o caso, Ananda, nós não deveríamos nos regozijar nos estados condicionados, nós deveríamos deixar de ter interesse neles e libertarmo-nos deles.

2.17. “Seis vezes, Ananda, eu me recordo de haver descartado o corpo neste lugar e na sétima vez eu o descartei como um Monarca que girou a roda, um monarca justo de acordo com o Dhamma, conquistador dos quatro pontos cardeais, inconquistável, que havia estabelecido a segurança no meu reino e que possuía sete tesouros. Mas, Ananda, eu não vejo nenhum lugar neste mundo, com os seus devas, maras e Brahmas ou nesta população, com os seus contemplativos e Brâmanes, príncipes e povo, onde o Tathagata irá pela oitava vez descartar o corpo.”

Isso foi o que disse o Abençoado. Tendo dito isso, o Mestre disse mais:

“Impermanentes são as coisas condicionadas, sujeitas à origem e cessação. Tendo surgido, elas são destruídas, a sua cessação é a verdadeira bem-aventurança.”

 


 

Notas:

[1] Este sutta é uma continuação da conversa registrada no DN 16.5.17. A mesma história também ocorre, com algumas pequenas variações, no Mahasudassana Jataka (No. 95). Tal como no DN 5, o Buda, ao final, identifica o caráter principal da história como sendo ele mesmo numa vida passada. [Retorna]

[2] Os cinco tipos de instrumentos são: tambores com couro de um lado, com couro em ambos lados, completamente cobertos com couro, címbalos e o vento. [Retorna]

[3] Veja o DN 2 – nota 2. [Retorna]

[4] Rhys Davis declara de forma categórica: “Esse é o disco do Sol”, que simboliza a autoridade real e a lei moral. [Retorna]

[5] Veja o DN 26 – nota 9. [Retorna]

[6] Iddhi: bastante distintos dos poderes mencionados no DN 2.87. [Retorna]

[7] No DN 2.17 Purana Kassapa nega que essas ações gerem mérito. [Retorna]

[8] As quatro moradas divinas (Brahmaviharas). Igual ao DN 13.76. [Retorna]

[9] A mesma postura adotada pelo Buda no parinibbana e em outras ocasiões. Veja o DN 16.4.40.[Retorna]

[10] Conforme o DN 16.4.37.[Retorna]

[11] Esses podem ser nomes ou podem significar respectivamente “Senhora Khattiya” e “Jovem donzela”. Mas o que aconteceu com Subhadda? [Retorna]

 

 

Revisado: 18 Novembro 2006

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